sábado, 6 de maio de 2017

Etapa 314 - 2º. excerto da recordação L, O caminho do amor - que bela história!

      Na pista em que ocorreu a etapa de ontem vai também hoje ser via de busca e de procura do caminho da amor, um bem tão precioso e tão apetecido que muitas vezes desperdiçamos. Que Deus nos perdoe.

Eis o prometido; a mais bela histórias de amor!

      "Esta é a história de uma senhora com setenta e oito anos e de um senhor com setenta e sete. Já estão juntos há mais de cinquenta anos, mas nos últimos anos, São fora consumida pela" doença da alma", mais conhecida por Alzhheimer. Essas duas pessoas são os meus visavós, e não podia ter mais orgulho neles.
      Com as suas mãos inchadas, calejadas e de pele espessa, Manuel agarra a malga da sopa de feijão e enche uma colher, que depois leva à boca de São. Ouve-se ela engolir a sopa de feijão que lhe corre pelo corpo, e São sorri, Manuel sorri-lhe de volta e com dois dedos, ajeita-lhe o esbranquiçado cabelo, quase tão branco como  neve e, ela ri-se, ele ri-se. Os dois olhos verdes de São, verdes como esmeraldas e cintilantes, são irrequietos, mas vazios.
      Os olhos de Manuel são castanhos e cansados, mas ambos, têm um olhar que conjugado, constrói algo de extraordinário, um olhar apaixonado, um olhar vazio, cheio de tudo mas cheio de nada. São ri-se, como se sua vida dependesse disso, ri-se, e de repente, assim muito rápido, como quem fecha e abre os olhos involuntariamente, São deixa cair uma lágrima de fúria, agarra no cobertor que Manuel lhe tinha posto em cima das pernas para que ficasse quentinha, tenta atirá-lo para o chão e diz: "tira-me esta..., tira-me esta..., estás a ouvir? tira-me esta... ", é a única coisa que diz, grita e vai gemendo até que Manuel lhe diga que vai tirar, mas depois nunca tira, porque ele só quer que São fique quentinha, ele só quer o bem dela. São não faz por mal, faz parte da doença que a consome. Esta troca de emoções acaba tudo por se tornar normal, São acaba por se esquecer,  de repente, já sorri de novo. E agora, parece uma criança contente correndo com suas bonecas de trapos pelo jardim. Manuel fica contente com ela. No ar sente-se o odor de uma infância fantástica, conjugada, pintada a preto e branco.
      Lá vai mais um colher de sopa para a boca de São. "Linda menina" diz o Manuel e sorri! De novo, São sorri também. Esta troca, este contágio de sorrisos tornou-se já habitual. Noutro momento, São diz: " minha mãe está muito doentinha!" e geme, quase que chora, Manuel agarra-lhe a mão e a acaricia. A mão de São está muito inchada, pois ela não se move, Manuel inclina-se para beijar a bochecha de São,  mas ela reage amedrontada  o seu tom de voz eleva-se e volta a dizer, "a minha mãe está doentinha!" e agora grita com seus olhos a arder  em dor  desespero, mas, Manuel é paciente e consegue acalma-la mais uma vez.
      E, lá vão mais duas colheres de sopa de feijão. Novamente, a troca, o contágio de sorrisos. Manuel sussurra,  "São, quem sou eu? como é que eu me chamo?", São olha para Manuel nos olhos e desta vez, o seu olhar torna-se tão profundo que quase dói, São não sabe responder à pergunta que lhe fora posta. Depois, depois esquece-se de tudo e desvia o olhar, a pergunta fora abandonada, fora esquecida, ficara a flutuar, sem saber para onde ir, e depois? depois lembra-se do cobertor e de como a incomodava e volta a dizer; "tira-me esta...! tira-me esta...!" e Manuel, por momentos desliga-se do mundo, fecha os olhos e inspira. Volta a acalmar a São, mas São volta, faz e diz sempre as mesmas coisas, e Manuel, tem sempre de a acalmar. Manuel é paciente, sempre fora e continuará, porque pouco e pouco, com a situação com que lida, aprende a sê-lo ainda mais. Porém, Manuel não é sempre forte. 
      Manuel às vezes chora, escondido na sua própria alma, Manuel chora, não lhe são precisas lágrimas para chorar, basta haver dor, ou então, basta haver amor para que chore,  chora porque São é linda, tanto por fora como por dentro, e porque a ama e porque faz sacrifícios por ela. Demasiados nunca serão, pois ele sabe que São merece todo o amor e cuidados do mundo, ou ainda mais, porque São sempre tratou dele e isso é amor, verdadeiro amor, pelo menos é o que eu acho. E às vezes, sinto a alma de Manuel a gritar: Ela não sabe quem eu sou, mas eu sei quem ela é."

      Acabei de transcrever o retrato do meu primo Manuel (filho da Emília, irmã de meu pai) e de sua esposa Ascensão, feito, visto e apreciado pela sua bisneta Edna, menina que muito admiro, que respeito e amo, que beleza de menina! seus avós e pais merecem-na, que Deus os ajudem. 
      A menina Edna, no seu retrato, termina o penúltimo parágrafo a dizer que, Manuel não é sempre forte! teve razão! pois a doença da São agravou-se e Manuel não resistiu, Deus já levou os dois, mas ele, vencido pelo desgosto, pelo cansaço e pela doença que tinha sem saber, despediu-se no dia 30 de Agosto de 2015 e no dia 31, foi com Deus. Ela, a São, sem dar sinais de saber que estava no mundo ainda cá ficou, os Anjos vieram buscá-la no dia 13 de Abril, deste ano 2017.

      Manuel, meu bom primo e melhor amigo, na esperança de que tua esposa se tenha reencontrado contigo, dou-te parabéns pela família que constituístes e que, com o teu exemplo formastes, olha do alto e vê, depois do tanto trabalho, apesar de, vergado pela fadiga nos teres deixado, não foi derrota, pelo contrário, Deus chamou-te para te entregar o prémio que ganhastes. A tua vitória é por todos reconhecida e valorizada com a consolação do teu dever cumprido. O fim da nossa vida não é o fim do mundo, daquilo que fomos, haverá sempre alguém que recorde e conte a história, as sementes germinam nos campos e nascem, umas dão flores, outras dão frutos, e tu, que castigastes o teu corpo, cá o deixastes, foste limpo e puro, para, no Reino que não se vê, que não se apalpa, mas que a nossa fé imagina, gozares da felicidade e do descanso que mereces.
 
      Até amanhã, manhã, dia da Mãe, há mais e mais amor.
 
      O santo de hoje é: Santo Evódio, Bispo e Mártir
      ( + Caríntia, 304) "Recebeu a sagrada episcopal do próprio Apóstolo São Pedro, a quem sucedeu na Sé de Antioquia. Naquela mesma cidade foi martirizado. Segundo a tradição, tinha sido discípulo de Nosso Senhor".
      Oração: - Não conheço e não encontrei.


 
 


     

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